sábado, 7 de março de 2009

O Rei de Marfim


Show
Roberto Carlos – Gravação de Especial
Data: 11 de dezembro de 2008
Local: HSBC Arena - Rio de Janeiro
Foto: Tom Neto

Resenha publicada originalmente no TOM NETO.COM.


Deixando de lado as cores azul e branco, Roberto Carlos recebe Zezé di Camargo & Luciano, Neguinho da Beija-flor, Rita Lee e Caetano Veloso em seu tradicional especial de fim de ano

Um engarrafamento monstro que se estendeu da praia do Leblon até a metade da Avenida Niemeyer fez com que eu chegasse atrasado a uma HSBC Arena totalmente lotada. A sorte é que o início do espetáculo – marcado para as 21 horas – também atrasou um pouquinho...

Precisamente às 22h30, os músicos iniciaram o medley instrumental de sucessos de Roberto Carlos, que sempre antecede a entrada do artista ao palco – para delírio da platéia. Deixando de lado o tradicional azul – ou branco –, o Rei surge em um elegante terno de cor... marfim.

As pessoas menos atentas podem pensar que RC realiza sempre o mesmo show, que começa com “Emoções” e termina com “Jesus Cristo”, tendo, no recheio, “Detalhes” no esquema banquinho-e-violão. Mas não é bem assim. O roteiro atual é absolutamente diferente das apresentações de dois, três anos atrás.

Retornaram ao repertório “Mulher de 40” (a melhor de todas as canções de “homenagens” que Roberto compôs nos anos 90), “Mulher Pequena” e, pasmem, a erótica “O Côncavo e O Convexo” - por sinal, em um bom arranjo. Foram mantidas no set listAlém do Horizonte”, “É Preciso Saber Viver”, “Como É Grande O Meu Amor por Você”, “Negro Gato” (o único número que precisou ser repetido) e a sempre infalível “Outra Vez”.

Em contrapartida, ficaram de fora “Eu te Amo, te Amo, te Amo” e “Amor Perfeito”, além das recentes “Pra Sempre”, “Acróstico”, “Eu te Amo Tanto” e “Amor Sem Limite” - sem contar cavalos-de-batalha como “Proposta”, “Café da Manhã”, “Cavalgada”...

Como de praxe, não poderiam faltar os convidados especiais. Os primeiros da noite foram Zezé di Camargo & Luciano, que cantaram sozinhos “A Distância” e, na companhia do anfitrião, “O Portão”.

Na seqüência, Neguinho da Beija-Flor cantou com Roberto uma dobradinha de sua bela “Negra Ângela” (já gravada por Belo e pelo Soweto) com “Eu e Ela”, sucesso do Rei. Em seguida, a bateria da Beija-Flor de Nilópolis foi chamada ao palco, para acompanhar Neguinho e RC no samba-exaltação “A Deusa da Passarela”.

O dueto com Rita Lee, acompanhada da família – o marido, Roberto de Carvalho, e o filho Beto Lee – foi um dos pontos altos da noite. Mostrando entrosamento, Rita e RC fizeram bonito ao emendar sucessos dela, como “Papai, me Empresta o Carro”, “Flagra”, “Mania de Você” e “Baila Comigo”, com outros dele, como “Parei na Contramão”, “Splish, Splash” e “Cama e Mesa”. Espirituosa, a rainha do rock nacional ainda citou “Garota do Roberto”, de Waldirene (“Sou a garota papo firme que o Roberto falou”).

Mas a melhor participação foi realmente a de Caetano Veloso. “Debaixo dos Caracóis dos seus Cabelos”, a canção que Roberto compôs após visitar Caetano em seu exílio londrino, foi a senha para a entrada do compositor baiano em cena. No melhor momento do show, uma emocionante “Força Estranha”, com seu grandiloquente arranjo de blues, foi cantada pela dupla pela primeira vez. Sozinho, Caê cantou “Você É Linda”, acompanhado pela banda de Roberto - e pela platéia embevecida.

A lamentar, o som da HSBC Arena, que poderia estar bem melhor. E também o fato de o recente projeto que reuniu Roberto Carlos e Caetano Veloso, A Música de Tom Jobim, ter sido mencionado uma única vez – quando ambos cantaram “Chega de Saudade”, com a participação do neto do Maestro Soberano, Daniel Jobim, no piano. As versões do Rei para “Eu Sei que Vou te Amar”, “Lígia” e, principalmente, “Por Causa de Você” são impecáveis. E mereciam integrar o roteiro.

Mesmo assim, certamente ninguém voltou para casa insatisfeito...



Veja o vídeo de “O Côncavo e O Convexo:

‘Esquerda e Direita’ ou ‘Samba do Crioulo Doido’

Este é, inequivocamente, um blog sobre música. Ponto. Mas existem outros assuntos que despertam o meu interesse - política, por exemplo. Creio que os dois temas - música e política - não são necessariamente excludentes.

Além disso, embora respeite quem decida ser apolítico, considero isso simplesmente... o fim da picada. Como dizia Bertold Brecht, “o maior analfabeto é o analfabeto político”.

O artigo abaixo foi escrito logo após o resultado do segundo turno das eleições municiais de 2008.



Artigo publicado originalmente no TOM NETO.COM.


Chega a ser risível ouvir as pessoas, públicas ou não, afirmando com veemência que são, do ponto de vista ideológico, de direita ou de esquerda. Considerando a promiscuidade política que há no Brasil, dizer esse tipo de coisa não faz lá muito sentido.

O PT, por exemplo, era inicialmente uma sigla de esquerda, embora o presidente tenha declarado no ano passado que “nunca foi de esquerda”. Bem, melhor nem comentar. O fato é que, durante muitos anos, as posições sempre radicais do partido impediram sua chegada ao Palácio do Planalto.

Dessa forma, o PT formou, para a disputa das eleições presidenciais de 2002, uma aliança com o antigo PL* - fundado pelo falecido deputado Álvaro Valle -, partido de proposta claramente conservadora. Ou seja, de direita. Inclusive, honrando a tal aliança, o vice-presidente da República, José Alencar, era filiado ao PL.

Existem, contudo, outras situações curiosas. O PSDB, assim como o PT, possui, em seus quadros, indivíduos que, durante os chamados “anos de chumbo”, sofreram perseguições e foram exilados, tais como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e o atual governador de São Paulo, José Serra.

E hoje, por ironia, o PSDB é aliado político justamente dos Democratas, o famoso DEM. Para quem não sabe, o DEM nada mais é do que o novo nome do PFL, que, por sua vez, era um desdobramento do PDS, a antiga ARENA - o partido dos governadores e prefeitos “biônicos” nomeados pelo governo militar.

O mais surpreendente, no entanto, foi ver, no segundo turno das eleições de 2006, as imagens do encontro entre Jorge Bornhausen, presidente do então PFL – a sigla ainda não havia mudado de nome na ocasião –, e Roberto Freire, presidente do PPS. O PPS, pasmem, é uma dissidência do PCB, o Partido Comunista do Brasil (!), também conhecido como “Partidão” .

Diante desse verdadeiro “samba do crioulo doido”, alguém aqui no Brasil ainda se arrisca em dizer que é de esquerda ou de direita?




* Em 2006, houve uma fusão do PL com o PRONA – partido fundado pelo também falecido deputado Enéas “meu nome é Enéas!” Carneiro –, que acabou gerando o PR (Partido da República).