sábado, 18 de abril de 2009

Paul McCartney: mais para ‘incendiário’ do que para ‘bombeiro’


CD
Electric Arguments (ATO, importado)
2008

Resenha publicada originalmente no TOM NETO.COM.


No terceiro álbum do projeto The Fireman, ex-Beatle surpreende pela ousadia e inspiração

Prestes a completar 67 anos de idade, Sir Paul McCartney, autor de algumas das mais belas canções do mundo, poderia muito bem se acomodar como um magnata do pop. Mas não. Inquieto, o ex-Beatle ainda se dá ao luxo de editar (ótimos) CDs com material inédito – como os recentes Chaos And Creation In The Backyard, de 2005, e Memory Almost Full, de 2007 –, e se aventurar em turnês mundiais.

Além disso, Macca mantém um projeto paralelo de ambient music com o produtor Youth – ex-membro do Killing Joke e eventual colaborador do The Orb –, chamado The Fireman. A parceria já rendeu dois álbuns: Strawberries Oceans Ships Forest (1993) e Rushes (1998). No finalzinho de 2008, chegou às prateleiras o terceiro trabalho da dupla: Electric Arguments.

A diferença deste para os anteriores é clara: enquanto seus antecessores apostavam em uma estética absolutamente experimental, Electric Arguments – mesmo tendo seus momentos experimentais, é bom frisar –, é o que mais se aproxima do que poderíamos definir como “um disco de Paul McCartney”. Ainda que bem modernoso...

A faixa de abertura, o blues lisérgicoNothing Too Much Just Out Of Sight”, primeiro single de trabalho, pode (e vai) assustar os fãs mais conservadores, com seus vocais ensandecidos que parecem ter sido gravados em um manicômio. Mas, daí por diante, o repertório traz, na acepção da palavra, canções com o padrão McCartney de qualidade.

Two Magpies”, delicioso jazz tipo fim-de-noite, lembra “Baby's Request” (de Back To The Egg, dos Wings) e “Honey Pie” (do chamado Álbum Branco, dos Beatles). Já a etérea “Traveling Light”, com seu clima floydiano, possui o registro vocal mais grave e sombrio que Macca já gravou em toda a sua extensa carreira.

A bem da verdade, a faceta The Fireman só aparece com mais nitidez nas últimas três faixas do álbum, “Lovers In A Dream”, “Universal Here, Everlasting Now” e a ótima “Don't Stop Running” (simplesmente de cair o queixo).

Contudo, o melhor momento do álbum, decididamente, é “Sing The Changes”, pop grandiloquente e emocionante que funcionaria às mil maravilhas ao vivo. Tanto que já ganhou até videoclip.

Em linhas gerais, se Electric Arguments não fosse, por si só, um disco muito bom, já valeria pela ousadia. Curioso é constatar que, até os dias de hoje, ainda há quem pense que foi John Lennon, e não Paul McCartney – para quem não sabe, o criador do conceito de Sgt. Peppers', por exemplo -, o grande revolucionário dos Beatles...



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Veja o vídeo de “Sing The Changes”:


sexta-feira, 17 de abril de 2009

Oasis: grata surpresa


CD
Dig Out Your Soul (Sony & BMG)
2008

Resenha publicada originalmente no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 147 (novembro de 2008).


‘Dig Out Your Soul’ é o melhor disco do Oasis em muitos anos

Três anos após Don't Believe The Truth – um disco bem interessante, aliás –, o Oasis não apenas confirma a curva ascendente como também se supera em Dig Out Your Soul, seu sétimo álbum de estúdio (sem contar The Masterplan, compilação de lados B editada em 1998). No intervalo entre o atual e o anterior, rolou a coletânea “esquisita” Stop The Clocks, de 2006.

Mas atenção: dizer que Dig Out Your Soul é um bom álbum não significa que o Oasis tenha conseguido fazer uma nova “Champagne Supernova” ou outra “Wonderwall”. O Britpop foi bacana, mas ficou lá nos anos 90. E os irmãos Gallagher sabem disso.

Mesmo sem abrir mão das boas melodias de sempre, o Oasis resssurge áspero, urgente, sem o menor odor de naftalina. A faixa de abertura é um belo cartão de visitas: “Bag It Up” é um rock marcial, algo psicodélico, gravado quase inteiro com terça de vozes.

A canção seguinte é, provavelmente, a melhor do CD. Assumindo a influência de Ian Brown, “The Turning” traz toda a ginga dos Stone Roses (não nos esqueçamos que foi de Manchester que surgiram as chamadas “bandas de franjinha”, tipo Happy Mondays, Charlatans UK e Inspiral Carpets). Mas isso até desembocar em um refrão pesado, infalível. Vai funcionar ao vivo que é uma beleza. O finalzinho da música ainda cita “Dear Prudence”, de uma obscura banda de Liverpool chamada... Beatles.

Outra citação, desde o título até a levada, está na sombria “Waiting For The Rapture”: dessa vez de “Waiting For The Sun”, do The Doors. Alguém aí se lembra de “Imagine” na introdução de “Don't Look Back In Anger”?


Noel continua afiado como compositor

A partir do quinto álbum, Heathen Chemistry (2002), Noel Gallagher “democratizou” o processo de criação do Oasis. E os efeitos foram benéficos: isso acabou servindo para arejar o repertório da banda. Prova disso é que, atualmente, Liam consegue compor uma balada matadora como “I'm Outta Time”. Segunda faixa de trabalho, essa soa bem John Lennon – não por acaso, traz um sampler de uma declaração do próprio.

Mas Noel continua mandando muito bem. O Gallagher mais velho é o autor da bela “Falling Down”, da caipira (no melhor sentido) “(Get Off Your) High Horse” e da vibrante “The Shock Of Lightning”, primeiro single do álbum, e, desde já, uma das grandes canções da banda.

Em linhas gerais, Dig Out Your Soul é o melhor trabalho que o Oasis lança em muitos anos – e isso não é pouco. É provável que a carreira dos dois ilustres torcedores do Manchester City se beneficie bastante desse disco. Digo mais: aparecerá com destaque em qualquer lista de melhores álbuns do ano. É só esperar para ver.



P.S.: há também uma versão deluxe, dupla, cujo CD 2 traz remixes e lados B. Coisa muito fina. Vale a pena procurar.



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Veja os vídeos de “The Shock Of Lightning”...



...“I'm Outta Time”...



...e “Falling Down”:

Da série ‘Parcerias’: Samuel Rosa e Nando Reis

Artigo publicado originalmente no TOM NETO.COM.


É Uma Partida de Futebol” foi a primeira parceria entre Samuel Rosa, vocalista do Skank, e Nando Reis [no detalhe]. Apesar de a canção jamais ter ficado de fora dos shows da banda desde que foi lançada (em 1996, no álbum O Samba Poconé), a verdade é que... o quarteto mineiro já fez coisas bem melhores...

De qualquer forma, depois de “É Uma Partida de Futebol”, TODOS os discos do Skank trazem pelo menos uma parceria entre Samuel e Nando. E, de lá para cá, a dupla só teve acertos.

Em Siderado (1998), disco que sucedeu O Samba Poconé, surgiu a balada “Resposta”, que chegou a ser gravada por ninguém menos que Milton Nascimento, com a participação de Lô Borges. Apesar de Siderado ainda apresentar a sonoridade que identificava o Skank naquela época, “Resposta” sinalizava uma influência Beatles/Clube da Esquina que a banda jamais havia exposto até então.

No trabalho seguinte, Maquinarama (2000), houve o grande “cavalo-de-pau” na carreira do Skank. Tudo o que se insinuava em “Resposta” foi afirmado com letras garrafais no álbum que, do ponto de vista conceitual, fez muito pela carreira do Skank. E, mais uma vez a parceria Samuel Rosa-Nando Reis se fez presente na singela “Ali”.

Em 2003, o grupo editou Cosmotron, que veio ampliar as mudanças estéticas trazidas por seu antecessor. Um grande disco. E, dessa vez, uma música composta por Samuel, Nando e Lô Borges foi escolhida para ser a primeira faixa de trabalho: a bela “Dois Rios”.

A coletânea Radiola chegou às prateleiras em 2004. E, entre as duas inéditas, havia, claro, uma canção composta pelos dois amigos: a tristonha “Onde Estão?”.

Carrossel foi lançado em 2006. Bom álbum que não repetiu o êxito dos anteriores, traz uma música de Samuel com o ex-Titã logo na primeira faixa: “Eu e a Felicidade”.

Já o recém-lançado Estandarte, traz, ao contrário dos trabalhos anteriores, não somente uma, mas três (!) faixas da dupla: “Ainda Gosto Dela” - primeira música de trabalho, com participação de Negra Li nos vocais -, “Pára-Raio” e “Renascença”.


Veja os vídeos de “É Uma Partida de Futebol...



...“Resposta”...



...“Ali”...



...“Dois Rios”...



...e o dueto dos parceiros em “Eu e a Felicidade”:

Skank: recuo estratético


CD
Estandarte (Sony & BMG)
2008

Resenha publicada originalmente no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 147 (novembro de 2008).



Produzido novamente por Dudu Marote, o Skank recua para avançar

Dois anos após o seu último de inéditas, Carrossel – bom CD que não obteve a resposta comercial dos trabalhos anteriores –, o Skank volta à carga com Estandarte (Sony & BMG). Esse é o décimo álbum da banda mineira, contando com MTV Ao Vivo em Ouro Preto, de 2001, e a “anticoletânea” Radiola, de 2004.

Após um hiato de doze anos, Samuel Rosa & cia. são novamente produzidos por Dudu Marote. Entretanto, o retorno do produtor dos bem-sucedidos Calango (1994) e O Samba Poconé (1996) não deve ser interpretado como uma “volta ao passado”. Não. O Skank até soa mais... hum, festeiro do que nos últimos três discos. Mas nem por isso o ouvinte encontrará em Estandarte uma nova “Garota Nacional”.

(E que ninguém espere que os músicos se apresentem novamente vestindo camisas de futebol.)

Por sinal, os “metais em brasa”, tão característicos da sonoridade do quarteto em sua primeira fase, só aparecem na faixa que abre (bem) a bolacha. Com letra de Nando Reis, “Pára-Raio” evoca o swing de Roberto Carlos circa 1970 – fase “Todos Estão Surdos” – e fala de sexo com objetividade: “Páro dentro, entro e saio/ Falta você aqui”.

Na verdade, o que o Skank propõe em Estandarte é uma ruptura com a, digamos, “trilogia britânica” de Maquinarama, Cosmotron e Carrossel, colocando todas as suas facetas em uma mesma perspectiva. Afinal, “Esmola” e “Balada do Amor Inabalável” sempre conviveram harmoniosamente nas apresentações da banda.


Dançante e roqueiro... ao mesmo tempo

Dessa forma, para ser coerente com cada uma de suas fases, o grupo soa roqueiro em “Renascença” e “Notícias do Submundo”; pop em “Um Gesto Qualquer” e “Noites de um Verão Qualquer”; e bucólico na bela balada “Sutilmente” – prima-irmã de “Trancoso”, do disco anterior –, que traz o verso lapidar: “Mas quando eu estiver morto/ Suplico que não me mate, não/ Dentro de ti”.

O curioso é que, propositadamente ou não, os mineiros acabaram conduzindo o seu som para um outro caminho. Nos momentos em que a banda soa dançante, também acaba soando roqueira... ao mesmo tempo. O melhor exemplo disso é “Chão”, talvez a melhor do disco. O Skank declarou que Estandarte foi inteiramente composto durante jam sesssions no estúdio. E, de todas as músicas do álbum, “Chão”, com seu matador riff de guitarra, é onde isso fica mais perceptível.

Outro bom momento do CD é “Canção Áspera”. Na introdução – que lembra “Um Homem Solitário”, de Carrossel – uma guitarra cria um clima western, como se fosse o score de algum filme de Ennio Morricone. Mas a pista é falsa. Logo surge um groove totalmente discothèque, tornando a faixa um dos destaques do álbum.

O disco só perde fôlego no refrão onomatopaico de “Assim Sem Fim”. Por sinal, o schubidu-bidau também atrapalha “Escravo”, cuja letra de imagens interessantes pediria um arranjo menos “animadinho”, mais rocker.

A primeira música de trabalho é “Ainda Gosto Dela”, com participaçao de Negra Li nos vocais. Também com letra de Nando Reis, a faixa alude a Jorge Ben (o refrão “E eu ainda gosto dela/ Mas ela já não gosta tanto assim” remete imediatamente a “Ela já não gosta mais de mim/ Mas eu gosto dela mesmo assim”, de “Que Pena”). À primeira audição, não é infecciosa como “Uma Canção É pra Isso”, single que puxava o disco anterior. Mas depois de ouví-la três vezes, torna-se uma velha conhecida. Estourada nas FMs, já faz parte da extensa lista de hits do Skank.

Mesmo sem atingir o nível de excelência de Maquinarama ou, principalmente, Cosmotron, o Skank, mais uma vez, agiu com inteligência. Estandarte mostra que a intenção do “passo atrás” da banda era, na verdade, dar dois passos à frente.



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Veja o vídeo de “Ainda Gosto Dela”: