CD Duets: An American Classic (Sony BMG)
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
Octogenário crooner mostra que nem tudo está perdido na América
É lamentável que toda uma nação - no caso, a estadunidense - sofra hoje a rejeição do planeta inteiro. E tudo por causa de um governo capaz de absurdos criminosos em sua política externa, como a não-assinatura de um tratado visando reduzir a emissão de gases poluentes na atmosfera (o chamado Protocolo de Kyoto); práticas de tortura (na prisão de Guantánamo) condenadas pela Convenção de Genebra; o envio de tropas militares a países estrangeiros - ignorando solenemente o parecer das Nações Unidas; assassinatos de civis; e execuções com crueldade característica... dos próprios executados (que diferença há entre a vítima e o algoz?).
Mas será que, especificamente, o povo norte-americano deve ser responsabilizado por esses descalabros? Bem... o atual presidente não somente foi eleito pelo povo, como também - o que é ainda pior - reeleito.
Todavia, quando falamos sobre ARTE, confundir alhos com bugalhos é pura idiotia: o imortal encanto exercido pela grande canção norte-americana não pode ser confundido com terrorismo institucional (sim, exatamente o que você leu). E o grande Tony Bennett está aqui para nos provar isso, mais uma vez.
A exemplo de Frank "The Voice" Sinatra e tantos outros, o já octogenário cantor resolveu aderir ao já tradicional projeto "com participação de convidados", o que resultou no ótimo CD Duets: An American Classic (Sony BMG). E Bennett conseguiu reunir um elenco estelar para o acompanhar nessa empreitada: Barbra Streisand (em boa versão da ancestral "Smile", de Charlie Chaplin), Elton John, Dixie Chicks (trio feminino de country que arrebanhou cinco prêmios Grammy, tendo sido o grande vitorioso desse ano), James Taylor, Billy Joel, k.d. lang (com quem o anfitrião gravou o álbum A Wonderful World, em 1992) e até o pop star colombiano Juanes, ente outros.
Produzido pelo experiente Phil Ramone, An American Classic apresenta a característica sonoridade de big band onde Bennett atua com desenvoltura. E, só para lembrar, foi justamente Ramone quem produziu os dois volumes de duetos de Sinatra e também Songs From The Last Century (1999), de George Michael (que, definitivamente, atingiu a maioridade em sua carreira), aqui impecável em "How do You Keep the Music Playing?". O mesmo vale Elvis Costello, Bono e Sting, todos já perfeitamente aclimatados em standards como "Are You Havin' Any Fun?", "I Wanna Be Around" e "The Boulevard Of Broken Dreams", respectivamente.
Sir Paul McCartney também se mostra absolutamente confortável em "The Very Thought Of You". E o não menos que genial Stevie Wonder brilha na delicada releitura de "For Once In My Life" (laureada esse ano com o Grammy no quesito pop vocal com colaboração), canção já gravada pelo próprio Wonder em arranjo totalmente funky, que obteve grande êxito nos anos 70.
A voz de Bennett, obviamente, não é a mesma de outrora. Contudo, apesar da contingência etária, o veterano crooner cometeu um álbum excelente (que, aliás, levou para casa o Grammy na categoria pop vocal tradicional) - atestando, com sua arte, que nem tudo está perdido na América.
A propósito: Tony Bennett regravou mais uma vez "I Left My Heart In San Francisco", sim. Só que essa, claro, ele preferiu cantar sozinho...
Esse blog reúne mais de 200 resenhas e artigos que tenho escrito ao longo dos anos para o jornal musical carioca IM - International Magazine - do qual fui colaborador de 2005 a 2009 -, para o portal Let's Rock e para o tomneto.blogspot.com. Para reproduzir qualquer texto deste blog, entre em contato com o autor.
segunda-feira, 28 de maio de 2007
George Benson & Al Jarreau: par de ases
CD
Givin' It Up (Concord, importado)
2006Givin' It Up (Concord, importado)
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
Givin' It Up é o (feliz) resultado do encontro dos dois craques
Pela lógica, quando um dos maiores guitarristas vivos do mundo une forças ao único vocalista que conseguiu a façanha de ganhar o Grammy em três (!) categorias distintas (jazz, pop e r&b, respectivamente), a hipótese mais provável... é que saia coisa boa. Não deu outra: Givin' It Up (Concord, importado) é um trabalho que honra a reputação dos norte-americanos George Benson e Al Jarreau.
Coerente com a carreira de ambos, o disco transita com desenvoltura e competência entre o virtuosismo do jazz e a fluência do pop e do r&b, onde a palavra de ordem era "colaboração", sem o menor sinal de egotrip - o que é surpreendente, em se tratando de dois artistas dessa envergadura.
Isso fica claro no clássico "Breezin'", de Bobby Womack, grande sucesso de George Benson (inclusive, é o título de seu álbum de 1976), da qual Al Jarreau aqui, brilhantemente, se apropria. A "resposta" vem logo a seguir: a pop e (com o perdão do trocadilho) ensolarada "Morning", provavelmente o maior hit de Jarreau, aparece quase inteiramente instrumental, dedilhada na insuspeitada guitarra de Benson.
Outro grande momento é "Every Time You Go Away", de Darryl Hall (da dupla com John Oates), grande sucesso dos anos 80 na voz de Paul Young. A dupla brilha também em "Summer Breeze", do duo Seal & Crofts e em "Ordinary People" do incensado cantor e pianista John Legend.
Givin' It Up apresenta ainda um elenco all star de convidados: Herbie Hancock (que dispensa apresentações); os contrabaixistas Stanley Clarke e Marcus Miller; a cantora Patti Austin (que fez dueto com Benson em "Moody's Mood", de 1980); e o pianista e o jovem trompetista Chris Botti.
O melhor, no entanto, ficou para o final: "Bring it on Home to Me", soul dilacerado de Sam Cooke, tem o auxílio luxuoso de ninguém menos do que Sir Paul McCartney - que, sem nenhuma cerimônia, acaba roubando a cena.
E, mencionando mais uma vez o Grammy, vale lembrar que Givin' It Up recebeu três indicações para a premiação: "God Bless the Child" (performance vocal de r&b tradicional); "Breezin'" (performance de r&b em duo ou grupo, com vocais); e "Morning" (pop instrumental) - tendo sido premiado com essa última. E não é difícil imaginar por quê.
Julio Iglesias no idioma de Shakespeare
CD Romantic Classics (Sony BMG)
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
O galã da menop... ops, cantor espanhol se aventura em sucessos consagrados em inglês. E não é que, dessa vez... convence?
Poucos artistas na música mundial geram tanta controvérsia quanto Julio Iglesias. O cantor espanhol (nascido em Madrid, em 1943) já vendeu, em toda a sua carreira mais de 100 milhões de discos e possui enorme público, formado especialmente de senhoras de meia-idade - o que lhe valeu o lisonjeiro apelido de "galã da menopausa". Por outro lado, Iglesias conta também com um vasto exército de detratores, que não toleram seu repertório ultra-romântico, seus arranjos (invariavelmente pasteurizados), sua peculiar maneira de cantar e seus maneirismos no palco.
E, dessa vez, Iglesias apresenta Romantic Classics (Sony BMG), um álbum apenas com canções em inglês. Na verdade, não é a primeira vez em que ele se aventura em algo assim: Crazy (de 1994, no qual gravou "Fragile", de Sting) trafegava na mesma seara. Mas agora as circunstâncias são outras.
Consta que esse disco era um antigo desejo do falecido pai do cantor, manifestado inclusive na última conversa telefônica entre ambos, após comentários sobre uma partida do Real Madrid. Após o falecimento de seu pai, o cantor decidiu prestar-lhe uma homenagem, colocando o projeto em prática.
Malandro que só, Julio Iglesias - ainda que muito distante de possuir um inglês brilhante - cometeu um trabalho com pouquíssimas probabilidades de erro: escolheu um set list de bem-sucedidas baladas, a maioria delas com inúmeras regravações, como "The Most Beautiful Girl" (já registrada por Ray Conniff, The Isley Broters, Perry Como e Tom Jones), a estupenda "This Guy's in Love with You" (de Burt Bacharach) e a delicada "How Can You Mend a Broken Heart", dos Bee Gees (regravada em 2004 pelo canadense Michael Bublé) que, aliás, tem a sua beleza preservada.
Cinco sucessos de FM dos anos 80 integram o repertório
O álbum inicia no clima country de "Everybody's Talking", já gravada por Deus-e-o-mundo - de Harry Nillson a B.J. Thomas, passando por Tony Bennett, Bill "Ain't No Sunshine" Withers, e até Roberto Carlos (numa interessante versão em português co-escrita com Erasmo em 1987). E Iglesias aproveita para registrar também "Always on My Mind", célebre na voz de Willie Nelson e Elvis Presley. E o espectro do Rei do Rock aparece também em "It's Impossible", de Armando Manzanero.
Numa possível tentativa de soar mais... hã... jovial, Iglesias montou quase metade do repertório com sucessos de FM dos anos 80, com versões corretas de "I Want to Know What Love Is" e "Waiting for a Girl Like You" (ambas do grupo Foreigner), "Drive" (The Cars), além da mediana releitura de "Careless Whispers" (a gravação original de George Michael permanece imbatível).
Já a melosa "Right Here Waiting", de Richard Marx (a faixa mais fraca do álbum), ficou irreconhecível sem a sua indefectível frase de piano da introdução.
Romantic Classics não fará com que os desafetos de Julio Iglesias mudem de idéia a seu respeito. Entretanto, se esse CD vier a tocar em um restaurante durante o horário de almoço... certamente não chegará a embrulhar o seu estômago. Pode acreditar.
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
O galã da menop... ops, cantor espanhol se aventura em sucessos consagrados em inglês. E não é que, dessa vez... convence?
Poucos artistas na música mundial geram tanta controvérsia quanto Julio Iglesias. O cantor espanhol (nascido em Madrid, em 1943) já vendeu, em toda a sua carreira mais de 100 milhões de discos e possui enorme público, formado especialmente de senhoras de meia-idade - o que lhe valeu o lisonjeiro apelido de "galã da menopausa". Por outro lado, Iglesias conta também com um vasto exército de detratores, que não toleram seu repertório ultra-romântico, seus arranjos (invariavelmente pasteurizados), sua peculiar maneira de cantar e seus maneirismos no palco.
E, dessa vez, Iglesias apresenta Romantic Classics (Sony BMG), um álbum apenas com canções em inglês. Na verdade, não é a primeira vez em que ele se aventura em algo assim: Crazy (de 1994, no qual gravou "Fragile", de Sting) trafegava na mesma seara. Mas agora as circunstâncias são outras.
Consta que esse disco era um antigo desejo do falecido pai do cantor, manifestado inclusive na última conversa telefônica entre ambos, após comentários sobre uma partida do Real Madrid. Após o falecimento de seu pai, o cantor decidiu prestar-lhe uma homenagem, colocando o projeto em prática.
Malandro que só, Julio Iglesias - ainda que muito distante de possuir um inglês brilhante - cometeu um trabalho com pouquíssimas probabilidades de erro: escolheu um set list de bem-sucedidas baladas, a maioria delas com inúmeras regravações, como "The Most Beautiful Girl" (já registrada por Ray Conniff, The Isley Broters, Perry Como e Tom Jones), a estupenda "This Guy's in Love with You" (de Burt Bacharach) e a delicada "How Can You Mend a Broken Heart", dos Bee Gees (regravada em 2004 pelo canadense Michael Bublé) que, aliás, tem a sua beleza preservada.
Cinco sucessos de FM dos anos 80 integram o repertório
O álbum inicia no clima country de "Everybody's Talking", já gravada por Deus-e-o-mundo - de Harry Nillson a B.J. Thomas, passando por Tony Bennett, Bill "Ain't No Sunshine" Withers, e até Roberto Carlos (numa interessante versão em português co-escrita com Erasmo em 1987). E Iglesias aproveita para registrar também "Always on My Mind", célebre na voz de Willie Nelson e Elvis Presley. E o espectro do Rei do Rock aparece também em "It's Impossible", de Armando Manzanero.
Numa possível tentativa de soar mais... hã... jovial, Iglesias montou quase metade do repertório com sucessos de FM dos anos 80, com versões corretas de "I Want to Know What Love Is" e "Waiting for a Girl Like You" (ambas do grupo Foreigner), "Drive" (The Cars), além da mediana releitura de "Careless Whispers" (a gravação original de George Michael permanece imbatível).
Já a melosa "Right Here Waiting", de Richard Marx (a faixa mais fraca do álbum), ficou irreconhecível sem a sua indefectível frase de piano da introdução.
Romantic Classics não fará com que os desafetos de Julio Iglesias mudem de idéia a seu respeito. Entretanto, se esse CD vier a tocar em um restaurante durante o horário de almoço... certamente não chegará a embrulhar o seu estômago. Pode acreditar.
domingo, 27 de maio de 2007
O Rei volta a investir no mercado latino
CDs Antología: Todos Los Grandes Éxitos (2006) e Grandes Éxitos (2007)
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007). Versão atualizada.
Coletâneas editadas no exterior fazem um balanço do sucesso de Roberto Carlos nos países de língua hispânica
Até 1997, Roberto Carlos manteve a constância de sua discografia internacional (direcionada majoritariamente aos países latinos), iniciada nos anos 70. Foi naquela década que o cantor começou a editar para o exterior um álbum rigorosamente igual - em capa, repertório, tudo - ao lançado no Brasil, porém com as letras em espanhol. Nos anos 90, os álbuns latinos de RC começaram a ter pequenas diferenças de repertório em relação aos discos anuais brasileiros. Exemplos: "Adonde Andarás Paloma", "Tristes Momentos", "Una Casita Blanca", e a sua ótima versão para "Me Vuelves Loco" (de Armando Manzanero, muito conhecida no Brasil graças à versão em português do mago Paulo Coelho, gravada por Elis Regina) permanecem inéditas em disco em território nacional. E a belíssima "Tengo que Olvidar", aparece apenas na compilação 30 Grandes Canciones (2000).
Em sua entrevista coletiva anual (concedida em dezembro último), o Rei declarou que faria um show em Madrid, ainda esse ano, no qual cantaria vários de seus sucessos vertidos para o idioma de Cervantes, além de clássicos do cancioneiro latino. E que esse espetáculo seria lançado em CD e DVD.
Por essa razão, a Sony espanhola, para aquecer as turbinas, editou naquele país a compilação Antología: Todos los Grandes Éxitos, trazendo, em dois CDs, os quarenta maiores sucessos de Roberto Carlos em língua hispânica, tais como: "Detalles", "La Distancia", "Amada Amante", "Emociones" e "Si El Amor Si Va" (que rendeu a RC um Grammy, em 1988), entre outras. As duas únicas faixas em português são "Eu Daria a Minha Vida", de Martinha, e "Namoradinha de um Amigo Meu".
Curiosidades: "Sentado a la Vera Del Camino", que Roberto gravou em dueto com o Tremendão Erasmo (no ótimo Erasmo Carlos Convida, de 1980) traz em Antología... a participação da americana Eydie Gormé. "Si Piensas... Si Quieres", que no Brasil foi gravada com Fafá de Belém em 1991, apresenta como convidada na versão hispânica a falecida cantora e atriz espanhola Rocío Dúrcal. E em "Amiga" (célebre duo com Maria Bethânia no original em português, de 1982), RC recebe a companhia da também espanhola Ana Belén.
O grande trunfo dessa coletânea, no entanto, é a inclusão de um DVD com dezessete aparições do Rei no canal espanhol TVE (Radio Televisión Española) de 1976 a 1994. Artigo de colecionador.
Todavia, o local das apresentações (realizadas nos dias 24 e 25 de maio desse ano) de Roberto Carlos acabou sendo transferido de Madrid para Miami, no Estado da Flórida, EUA . E, com essa motivação, a Sony lançou nova coletânea, Grandes Éxitos, desta vez direcionada à América Latina e ao território americano. Editada em CD simples, pode ser compreendida como uma versão compacta de Antología, contendo 16 sucessos do cantor - todos em espanhol. Recomendável apenas para as pessoas que querem se iniciar na obra do Rei.
Vale lembrar que não há previsão de lançamento dessas duas compilações no Brasil, o que é particularmente lamentável no caso da coletânea dupla. Entretanto, os produtos podem ser encontrados em algumas lojas virtuais.
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007). Versão atualizada.
Coletâneas editadas no exterior fazem um balanço do sucesso de Roberto Carlos nos países de língua hispânica
Até 1997, Roberto Carlos manteve a constância de sua discografia internacional (direcionada majoritariamente aos países latinos), iniciada nos anos 70. Foi naquela década que o cantor começou a editar para o exterior um álbum rigorosamente igual - em capa, repertório, tudo - ao lançado no Brasil, porém com as letras em espanhol. Nos anos 90, os álbuns latinos de RC começaram a ter pequenas diferenças de repertório em relação aos discos anuais brasileiros. Exemplos: "Adonde Andarás Paloma", "Tristes Momentos", "Una Casita Blanca", e a sua ótima versão para "Me Vuelves Loco" (de Armando Manzanero, muito conhecida no Brasil graças à versão em português do mago Paulo Coelho, gravada por Elis Regina) permanecem inéditas em disco em território nacional. E a belíssima "Tengo que Olvidar", aparece apenas na compilação 30 Grandes Canciones (2000).
Em sua entrevista coletiva anual (concedida em dezembro último), o Rei declarou que faria um show em Madrid, ainda esse ano, no qual cantaria vários de seus sucessos vertidos para o idioma de Cervantes, além de clássicos do cancioneiro latino. E que esse espetáculo seria lançado em CD e DVD.
Por essa razão, a Sony espanhola, para aquecer as turbinas, editou naquele país a compilação Antología: Todos los Grandes Éxitos, trazendo, em dois CDs, os quarenta maiores sucessos de Roberto Carlos em língua hispânica, tais como: "Detalles", "La Distancia", "Amada Amante", "Emociones" e "Si El Amor Si Va" (que rendeu a RC um Grammy, em 1988), entre outras. As duas únicas faixas em português são "Eu Daria a Minha Vida", de Martinha, e "Namoradinha de um Amigo Meu".
Curiosidades: "Sentado a la Vera Del Camino", que Roberto gravou em dueto com o Tremendão Erasmo (no ótimo Erasmo Carlos Convida, de 1980) traz em Antología... a participação da americana Eydie Gormé. "Si Piensas... Si Quieres", que no Brasil foi gravada com Fafá de Belém em 1991, apresenta como convidada na versão hispânica a falecida cantora e atriz espanhola Rocío Dúrcal. E em "Amiga" (célebre duo com Maria Bethânia no original em português, de 1982), RC recebe a companhia da também espanhola Ana Belén.
O grande trunfo dessa coletânea, no entanto, é a inclusão de um DVD com dezessete aparições do Rei no canal espanhol TVE (Radio Televisión Española) de 1976 a 1994. Artigo de colecionador.
Todavia, o local das apresentações (realizadas nos dias 24 e 25 de maio desse ano) de Roberto Carlos acabou sendo transferido de Madrid para Miami, no Estado da Flórida, EUA . E, com essa motivação, a Sony lançou nova coletânea, Grandes Éxitos, desta vez direcionada à América Latina e ao território americano. Editada em CD simples, pode ser compreendida como uma versão compacta de Antología, contendo 16 sucessos do cantor - todos em espanhol. Recomendável apenas para as pessoas que querem se iniciar na obra do Rei.
Vale lembrar que não há previsão de lançamento dessas duas compilações no Brasil, o que é particularmente lamentável no caso da coletânea dupla. Entretanto, os produtos podem ser encontrados em algumas lojas virtuais.
Os Beatles e o "lado negro da força"
Download gratuito Hate
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
DJ brasileiro dá a sua "resposta" a Love, de Sir George Martin
Love, o mashup (recriação musical por meio de adição de trechos de outras músicas) concebido por Sir George Martin e seu filho Giles como trilha sonora para a mais recente turnê mundial do Cirque de Soleil, trouxe desapontamento ao DJ e produtor brasileiro Fritz Von Runte. Por considerar que pai e filho não "ousaram como poderiam", Von Runte decidiu dar a sua "resposta".
E assim surgiu Hate ("Ódio"), o contraponto à obra dos Martin, cujo download gratuito pode ser feito (pelo menos por enquanto - porque é absolutamente improvável que o espólio dos Beatles permita algo dessa natureza por muito tempo) em http://www.thebeatleshate.com/index_bra.html.
Musicalmente (atenção: musicalmente), devemos reconhecer que o resultado é até interessante, pelo fato de o DJ - que afirma ser autor de mais de 80 mashups - ter adicionado seqüenciadores e efeitos inusitados às canções do quarteto de Liverpool, criando em seus remixes uma atmosfera nova.
O problema é que Von Runte abordou a obra dos Beatles como quem entra na casa da Mãe Joana - ou seja, sem pedir a menor licença. Além disso, ao contrário de George Martin e seu filho (que, na concepção de Love, utilizaram exclusivamente fonogramas dos Fab Four - obtendo um resultado, diga-se de passagem, estupendo), o DJ inseriu sons de outras procedências em suas colagens.
Não satisfeito, trocou até (pasmem!) os nomes das músicas: "Strawberry Fields Forever" se transformou em "War Fields Forever"; "Drive My Car" passou a ser "Drive My War"; "You've Got to Hide Your Love Away" agora se chama "You've Got to Hide Your Hate Away"; "Come Together" virou "Bomb Together", e por aí vai.
O que é isso, companheiro?
"Elegia ao ódio"?
Deixando agora a música de lado - apresento duas questões para que os leitores do IM - INTERNATIONAL MAGAZINE reflitam da maneira que julgarem mais conveniente: a) ainda que Von Runte não tenha utilizado parte da obra dos Beatles para fins comerciais - e, por essa razão, diz "não temer possíveis sanções" -, será que é correto manipular o maior cancioneiro popular do mundo assim, sem solicitar qualquer tipo de autorização?; b) não se trata de bancarmos os bonzinhos, mas - ainda que o sentimento de ira seja inerente à imperfeição que caracteriza os seres humanos - será que o mundo, da maneira que se apresenta, necessita de uma elegia ao ódio - ainda que seja contra a guerra?
Ou então - o mais demolidor dos argumentos - será que um militante pacifista como John Lennon (que um dia escreveu uma canção chamada "Give Peace a Chance", entoada por uma multidão em frente à Casa Branca como forma de protestar contra a Guerra do Vietnã) concordaria que algumas de suas canções fossem abordadas... dessa forma?
Tirem as suas próprias conclusões.
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
DJ brasileiro dá a sua "resposta" a Love, de Sir George Martin
Love, o mashup (recriação musical por meio de adição de trechos de outras músicas) concebido por Sir George Martin e seu filho Giles como trilha sonora para a mais recente turnê mundial do Cirque de Soleil, trouxe desapontamento ao DJ e produtor brasileiro Fritz Von Runte. Por considerar que pai e filho não "ousaram como poderiam", Von Runte decidiu dar a sua "resposta".
E assim surgiu Hate ("Ódio"), o contraponto à obra dos Martin, cujo download gratuito pode ser feito (pelo menos por enquanto - porque é absolutamente improvável que o espólio dos Beatles permita algo dessa natureza por muito tempo) em http://www.thebeatleshate.com/index_bra.html.
Musicalmente (atenção: musicalmente), devemos reconhecer que o resultado é até interessante, pelo fato de o DJ - que afirma ser autor de mais de 80 mashups - ter adicionado seqüenciadores e efeitos inusitados às canções do quarteto de Liverpool, criando em seus remixes uma atmosfera nova.
O problema é que Von Runte abordou a obra dos Beatles como quem entra na casa da Mãe Joana - ou seja, sem pedir a menor licença. Além disso, ao contrário de George Martin e seu filho (que, na concepção de Love, utilizaram exclusivamente fonogramas dos Fab Four - obtendo um resultado, diga-se de passagem, estupendo), o DJ inseriu sons de outras procedências em suas colagens.
Não satisfeito, trocou até (pasmem!) os nomes das músicas: "Strawberry Fields Forever" se transformou em "War Fields Forever"; "Drive My Car" passou a ser "Drive My War"; "You've Got to Hide Your Love Away" agora se chama "You've Got to Hide Your Hate Away"; "Come Together" virou "Bomb Together", e por aí vai.
O que é isso, companheiro?
"Elegia ao ódio"?
Deixando agora a música de lado - apresento duas questões para que os leitores do IM - INTERNATIONAL MAGAZINE reflitam da maneira que julgarem mais conveniente: a) ainda que Von Runte não tenha utilizado parte da obra dos Beatles para fins comerciais - e, por essa razão, diz "não temer possíveis sanções" -, será que é correto manipular o maior cancioneiro popular do mundo assim, sem solicitar qualquer tipo de autorização?; b) não se trata de bancarmos os bonzinhos, mas - ainda que o sentimento de ira seja inerente à imperfeição que caracteriza os seres humanos - será que o mundo, da maneira que se apresenta, necessita de uma elegia ao ódio - ainda que seja contra a guerra?
Ou então - o mais demolidor dos argumentos - será que um militante pacifista como John Lennon (que um dia escreveu uma canção chamada "Give Peace a Chance", entoada por uma multidão em frente à Casa Branca como forma de protestar contra a Guerra do Vietnã) concordaria que algumas de suas canções fossem abordadas... dessa forma?
Tirem as suas próprias conclusões.
Roupa Nova: Acústico 2 - a Missão
CD e DVD RoupAcústico 2 (Roupa Nova Music)
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
Grupo retoma os sucessos que ficaram de fora do primeiro RoupAcústico
Após a visibilidade obtida com RoupAcústico (2004), o grupo Roupa Nova apresenta a continuação desse projeto, sintomaticamente batizado de RoupAcústico 2 (Roupa Nova Music), gravado ao vivo em junho do ano passado no Tom Brasil (SP) e que, a exemplo de seu antecessor, está devidamente disponível em CD e DVD.
Aí você certamente se pergunta: "puxa, e eles têm repertório que justifique um repeteco desse tipo?". Mas é claro que sim: o sexteto - de grande técnica instrumental e impecável nas harmonias vocais - acumulou em 26 anos de carreira fonográfica uma verdadeira penca de sucessos populares que não caberiam em um único trabalho.
Bem, é claro que os maiores hits foram gravados no álbum anterior. Mas. de qualquer forma, RoupAcústico 2 garante a festa, com um set list de respeito: "De Volta pro Futuro", "Vício", "Felicidade", "Chama", "Tímida", a linda "Começo, Meio e Fim" (de Tavito, Ney Azambuja e Paulo Sérgio Valle) e "Amor de Índio" (de Beto Guedes e Ronaldo Bastos, uma das mais belas letras escritas no Brasil; seria necessário um artigo inteiro para interpretar as suas elaboradas imagens).
Como é de praxe em projetos desse tipo, não poderiam faltar os convidados: Toni Garrido em "Sensual"; a cantora e talentosa atriz Marjorie Estiano em "Flagra", de Rita Lee; e Pedro Mariano em "É Cedo", uma das três inéditas - as outras são "Retratos Rasgados" e "A Metade da Maçã".
A eficaz "Um Sonho a Dois", de Sullivan e Massadas, tem a participação de Cláudia "Babado Novo" Leitte - na gravação original (que fez bastante sucesso na década de 1980), era Joanna que fazia dueto com o grupo. Além de ser bonita pra chuchu, Cláudia canta muito bem e tem potencial para ultrapassar as fronteiras do limitado território do axé. Mas, para que isso ocorra, o primeiro passo é ela começar a se distanciar do estilo de Ivete Sangalo e buscar uma cara própria.
RoupAcústico 2, a exemplo de seu antecessor, faz jus à vitoriosa carreira do grupo. Contudo, depois de dois álbuns retrospectivos, resta agora saber como o Roupa Nova se comportará em um álbum inteiramente de material novo. Aguardemos.
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 130 (março de 2007).
Grupo retoma os sucessos que ficaram de fora do primeiro RoupAcústico
Após a visibilidade obtida com RoupAcústico (2004), o grupo Roupa Nova apresenta a continuação desse projeto, sintomaticamente batizado de RoupAcústico 2 (Roupa Nova Music), gravado ao vivo em junho do ano passado no Tom Brasil (SP) e que, a exemplo de seu antecessor, está devidamente disponível em CD e DVD.
Aí você certamente se pergunta: "puxa, e eles têm repertório que justifique um repeteco desse tipo?". Mas é claro que sim: o sexteto - de grande técnica instrumental e impecável nas harmonias vocais - acumulou em 26 anos de carreira fonográfica uma verdadeira penca de sucessos populares que não caberiam em um único trabalho.
Bem, é claro que os maiores hits foram gravados no álbum anterior. Mas. de qualquer forma, RoupAcústico 2 garante a festa, com um set list de respeito: "De Volta pro Futuro", "Vício", "Felicidade", "Chama", "Tímida", a linda "Começo, Meio e Fim" (de Tavito, Ney Azambuja e Paulo Sérgio Valle) e "Amor de Índio" (de Beto Guedes e Ronaldo Bastos, uma das mais belas letras escritas no Brasil; seria necessário um artigo inteiro para interpretar as suas elaboradas imagens).
Como é de praxe em projetos desse tipo, não poderiam faltar os convidados: Toni Garrido em "Sensual"; a cantora e talentosa atriz Marjorie Estiano em "Flagra", de Rita Lee; e Pedro Mariano em "É Cedo", uma das três inéditas - as outras são "Retratos Rasgados" e "A Metade da Maçã".
A eficaz "Um Sonho a Dois", de Sullivan e Massadas, tem a participação de Cláudia "Babado Novo" Leitte - na gravação original (que fez bastante sucesso na década de 1980), era Joanna que fazia dueto com o grupo. Além de ser bonita pra chuchu, Cláudia canta muito bem e tem potencial para ultrapassar as fronteiras do limitado território do axé. Mas, para que isso ocorra, o primeiro passo é ela começar a se distanciar do estilo de Ivete Sangalo e buscar uma cara própria.
RoupAcústico 2, a exemplo de seu antecessor, faz jus à vitoriosa carreira do grupo. Contudo, depois de dois álbuns retrospectivos, resta agora saber como o Roupa Nova se comportará em um álbum inteiramente de material novo. Aguardemos.
Paulo Ricardo: será que agora vai?
CD Prisma (EMI)
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 129 (fevereiro de 2007).
Ex-RPM retorna ao pop romântico com inéditas próprias, de Guilherme Arantes, Kiko Zambianchi e Nico Rezende. E essa talvez tenha sido a decisão mais sensata.
No exterior, a tradição dos cantores prossegue firme. Exemplos não faltam: desde o já octogenário norte-americano Tony Bennett, passando pelo mexicano Luis Miguel até, mais recentemente, o canadense Michael Bublé. Aqui no Brasil, entretanto, a linhagem que iniciou com Francisco Alves, continuou com Sílvio Caldas, Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Roberto Carlos, Paulo Sérgio, e desembocou em Fábio Jr, não encontra (sabe-se lá por quê) sucessores. Pelo menos, até o momento.
Daniel? Não, esse não conta. Alexandre Pires? Esse canta bem, tem noção de soul music americana (apesar da perigosa proximidade com o pagode mauriçola)... mas perdeu-se em algum ponto do caminho. Leonardo? Bem... trata-se de um cara simpático, de grande popularidade, porém com uma identificação muito específica com o universo sertanejo para assumir esse papel. De modo que esse nicho poderia muito bem ser explorado por Paulo Ricardo, que, tendo desistido de sua inacreditável candidatura a deputado federal (para piorar, ele concorreria pelo PFL, a legenda de ACM, Jorge Bornhausen e César Maia - valha-me Deus) ressurge com o recém-lançado Prisma (EMI).
Na resenha de seu trabalho anterior (o não necessariamente ruim, porém totalmente desnecessário), Acoustic Live, o IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, levantou essa lebre: "seria até melhor (e mais honesto) retomar a persona do cantor romântico, com um repertório autoral e, sobretudo, inédito". Coincidência ou não, foi exatamente isso o que PR fez. E de modo acertado, talvez: afinal, o seu período de maior êxito comercial pós-RPM (com exceção da própria ressurreição do grupo em 2002) foi justamente na fase de "Dois" e "Tudo por Nada".
O que pode vir a atrapalhar um pouco o desempenho de Prisma, é a inserção de faixas que não acrescentam muito, como "Gente (A Mais Bela História de Amor)" (versão de uma música da banda mexicana Presuntos Implicados, na qual Paulo Ricardo emula o canto falado de Lou Reed em um trip hop que não ata nem desata), "Um Dia de Sol" (do grupo gaúcho Papas da Língua), "Ímã do Amor" (inédita de Kiko Zambianchi) e "O Dia D, A Hora H", parceria com... Luiz Schiavon (sim, aquele mesmo do Domingão do Faustão).
Mas sabe de uma coisa? Tais deslizes não chegam a inviabilizar o projeto, que traz momentos até bem interessantes. No primeiro single de trabalho, "Diz", Paulo recorre ao romantismo de Roberto Carlos do período imediatamente após a Jovem Guarda: "se, por acaso, chover/ pode saber que sou eu/ chorando para te dizer/ adeus...". Do ponto de vista melódico, "A Pessoa Errada" remete exatamente à mesma fonte - o refrão lembra "Nada Vai Me Convencer", de Paulo César Barros, que o Rei gravou em 1969 (e o próprio PR em 1995).
Cantor faz referência a Tim Maia e resgata faixa obscura de seu antigo grupo
"Contradição", com sua introdução November Rain, é de autoria de Guilherme Arantes, fala de relacionamento aberto ("quando você chega à triste conclusão que quer uma pessoa só para si/ na verdade, você só consegue ter para si/ uma pessoa muito só") e cairia como uma luva em uma trilha de novela. O mesmo vale para a pop "Menina Linda (Tanto Faz)", "Longe" e a estradeira (com um quê de britpop) "A Chegada". Caso algum desses prognósticos venha a ser realizar, lembre-se: você leu primeiro aqui...
Já "Ninfa" foi resgatada do malfadado Paulo Ricardo & RPM, de 1993 - que, pensando bem, tinha pelo menos outras duas boas faixas: "Gênese" e "Pérola".
No entanto, o ponto alto do álbum, disparado, é a pulsante "Eu Vou Voltar pro Frio", parceria de Cláudio Rabello (que dividiu a produção de Prisma com Julinho Teixeira) com o também produtor, tecladista e cantor Nico Rezende, grande hit-maker da segunda metade da década de 1980, tendo sido gravado por Zizi Possi ("Perigo", "Noite"), Marina Lima ("Pseudo Blues"), Ritchie ("Transas"), Rosana ("Direto no Olhar"), e autor de "Esquece e Vem", grande sucesso em sua própria voz.
"Eu Vou Voltar..." alude instantaneamente a Tim Maia, desde a fala introdutória ("aumenta o retorno?") até o arranjo de metais. Some-se a isso um groove Earth, Wind & Fire e um preciosismo melódico pop digno de Lulu Santos e... está pronto o explosivo. Se alguém fizer um bom remix, vai direto para as pistas. E ainda que ninguém o faça, só por muita falta de sorte Paulo Ricardo deixará de fazer com que essa música, de alguma forma, aconteça. A verdade é uma só: se essa gravação - precisamente da maneira que foi realizada - estivesse em um CD do Ed Motta... a imprensa musical aplaudiria de pé.
E sabe quem está dizendo isso? É justamente o crítico que, no ano passado, torceu o nariz para a gravação de "Isn't She Lovely" (de Stevie Wonder) contida em Acoustic Live, por julgar PR um cantor "nem um pouquinho black".
Moral da história: entre acertos e equívocos (os arranjos, que ficaram a cargo do grupo Yahoo, poderiam ser bem melhores), dessa vez, a empreitada é válida. Afinal, quem você preferiria que estivesse habitando os programas de auditório e rádios populares: Paulo Ricardo (a quem um conceituado jornal carioca, em 1995, por ocasião do lançamento do bom Rock Popular Brasileiro, chamou de "o Emílio Santiago da nossa praia"), ou Banda Calypso, RBD...?
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 129 (fevereiro de 2007).
Ex-RPM retorna ao pop romântico com inéditas próprias, de Guilherme Arantes, Kiko Zambianchi e Nico Rezende. E essa talvez tenha sido a decisão mais sensata.
No exterior, a tradição dos cantores prossegue firme. Exemplos não faltam: desde o já octogenário norte-americano Tony Bennett, passando pelo mexicano Luis Miguel até, mais recentemente, o canadense Michael Bublé. Aqui no Brasil, entretanto, a linhagem que iniciou com Francisco Alves, continuou com Sílvio Caldas, Orlando Silva, Nelson Gonçalves, Roberto Carlos, Paulo Sérgio, e desembocou em Fábio Jr, não encontra (sabe-se lá por quê) sucessores. Pelo menos, até o momento.
Daniel? Não, esse não conta. Alexandre Pires? Esse canta bem, tem noção de soul music americana (apesar da perigosa proximidade com o pagode mauriçola)... mas perdeu-se em algum ponto do caminho. Leonardo? Bem... trata-se de um cara simpático, de grande popularidade, porém com uma identificação muito específica com o universo sertanejo para assumir esse papel. De modo que esse nicho poderia muito bem ser explorado por Paulo Ricardo, que, tendo desistido de sua inacreditável candidatura a deputado federal (para piorar, ele concorreria pelo PFL, a legenda de ACM, Jorge Bornhausen e César Maia - valha-me Deus) ressurge com o recém-lançado Prisma (EMI).
Na resenha de seu trabalho anterior (o não necessariamente ruim, porém totalmente desnecessário), Acoustic Live, o IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, levantou essa lebre: "seria até melhor (e mais honesto) retomar a persona do cantor romântico, com um repertório autoral e, sobretudo, inédito". Coincidência ou não, foi exatamente isso o que PR fez. E de modo acertado, talvez: afinal, o seu período de maior êxito comercial pós-RPM (com exceção da própria ressurreição do grupo em 2002) foi justamente na fase de "Dois" e "Tudo por Nada".
O que pode vir a atrapalhar um pouco o desempenho de Prisma, é a inserção de faixas que não acrescentam muito, como "Gente (A Mais Bela História de Amor)" (versão de uma música da banda mexicana Presuntos Implicados, na qual Paulo Ricardo emula o canto falado de Lou Reed em um trip hop que não ata nem desata), "Um Dia de Sol" (do grupo gaúcho Papas da Língua), "Ímã do Amor" (inédita de Kiko Zambianchi) e "O Dia D, A Hora H", parceria com... Luiz Schiavon (sim, aquele mesmo do Domingão do Faustão).
Mas sabe de uma coisa? Tais deslizes não chegam a inviabilizar o projeto, que traz momentos até bem interessantes. No primeiro single de trabalho, "Diz", Paulo recorre ao romantismo de Roberto Carlos do período imediatamente após a Jovem Guarda: "se, por acaso, chover/ pode saber que sou eu/ chorando para te dizer/ adeus...". Do ponto de vista melódico, "A Pessoa Errada" remete exatamente à mesma fonte - o refrão lembra "Nada Vai Me Convencer", de Paulo César Barros, que o Rei gravou em 1969 (e o próprio PR em 1995).
Cantor faz referência a Tim Maia e resgata faixa obscura de seu antigo grupo
"Contradição", com sua introdução November Rain, é de autoria de Guilherme Arantes, fala de relacionamento aberto ("quando você chega à triste conclusão que quer uma pessoa só para si/ na verdade, você só consegue ter para si/ uma pessoa muito só") e cairia como uma luva em uma trilha de novela. O mesmo vale para a pop "Menina Linda (Tanto Faz)", "Longe" e a estradeira (com um quê de britpop) "A Chegada". Caso algum desses prognósticos venha a ser realizar, lembre-se: você leu primeiro aqui...
Já "Ninfa" foi resgatada do malfadado Paulo Ricardo & RPM, de 1993 - que, pensando bem, tinha pelo menos outras duas boas faixas: "Gênese" e "Pérola".
No entanto, o ponto alto do álbum, disparado, é a pulsante "Eu Vou Voltar pro Frio", parceria de Cláudio Rabello (que dividiu a produção de Prisma com Julinho Teixeira) com o também produtor, tecladista e cantor Nico Rezende, grande hit-maker da segunda metade da década de 1980, tendo sido gravado por Zizi Possi ("Perigo", "Noite"), Marina Lima ("Pseudo Blues"), Ritchie ("Transas"), Rosana ("Direto no Olhar"), e autor de "Esquece e Vem", grande sucesso em sua própria voz.
"Eu Vou Voltar..." alude instantaneamente a Tim Maia, desde a fala introdutória ("aumenta o retorno?") até o arranjo de metais. Some-se a isso um groove Earth, Wind & Fire e um preciosismo melódico pop digno de Lulu Santos e... está pronto o explosivo. Se alguém fizer um bom remix, vai direto para as pistas. E ainda que ninguém o faça, só por muita falta de sorte Paulo Ricardo deixará de fazer com que essa música, de alguma forma, aconteça. A verdade é uma só: se essa gravação - precisamente da maneira que foi realizada - estivesse em um CD do Ed Motta... a imprensa musical aplaudiria de pé.
E sabe quem está dizendo isso? É justamente o crítico que, no ano passado, torceu o nariz para a gravação de "Isn't She Lovely" (de Stevie Wonder) contida em Acoustic Live, por julgar PR um cantor "nem um pouquinho black".
Moral da história: entre acertos e equívocos (os arranjos, que ficaram a cargo do grupo Yahoo, poderiam ser bem melhores), dessa vez, a empreitada é válida. Afinal, quem você preferiria que estivesse habitando os programas de auditório e rádios populares: Paulo Ricardo (a quem um conceituado jornal carioca, em 1995, por ocasião do lançamento do bom Rock Popular Brasileiro, chamou de "o Emílio Santiago da nossa praia"), ou Banda Calypso, RBD...?
Roberto Carlos: história viva
CD e DVD Duetos (Sony BMG)
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 129 (fevereiro de 2007). Disponível também no site oficial da JOVEM GUARDA.
O Rei compila duetos de seus especiais globais - escolhidos, segundo o próprio, por critérios "emocionais" - e lança em CD e DVD
Na sua tradicional entrevista coletiva anual, Roberto Carlos manifestou o desejo de ter lançado um álbum de inéditas no último Natal - e só não o fez, por ter, nas palavras do próprio, "demorado a começar a compor". Dessa feita, surgiu o projeto Duetos, que reúne em CD e DVD - como o título anuncia - duos de Roberto com ilustres convidados em seus especiais de fim-de-ano, escolhidos pelo Rei por critérios "emocionais".
Já se pode ouvir o murmúrio daqueles que Nelson Rodrigues classificaria como "os idiotas da objetividade", descontentes pelo fato de o cantor, mais uma vez, não ter lançado um trabalho com novas canções [o último foi Pra Sempre, 2003; e antes desse, Amor Sem Limite, 2000].
E o que há para se dizer sobre isso é simples: feliz do artista que atinge um determinado estágio na carreira, que permite que ele possa... se divertir (no melhor sentido) com seu farto acervo. O mesmo vale para os Rolling Stones, que, em 2003, lançaram a magnífica caixa quádrupla Four Flicks, reunindo três formatos diferentes de shows (estádio, arena e teatro), nos quais inúmeras pérolas obscuras foram resgatadas - algumas, até então, jamais haviam sido executadas ao vivo.
Outra observação que certamente será feita é a respeito da "diferença do padrão sonoro entre as faixas". Bem, considerando o hiato de 28 anos entre o fonograma mais antigo, de 1977, e o mais recente, de 2005 (e o conseqüente avanço das técnicas de gravação nesse período), esse contraste é natural, não?
Em Duetos, imediatamente, dois aspectos pouco comentados saltam aos olhos (e ouvidos). O primeiro é que Roberto é um soberbo intérprete para os clássicos de MPB - se ele, um dia, decidir lançar um álbum nesses moldes, certamente será um trabalho formidável. Os maiores exemplos disso são a tocante "Coração de Estudante", com direito a vocalises de Milton Nascimento e piano de Wagner Tiso, e "Lígia", com acompanhamento do maestro Antônio Carlos Jobim, onde o cantor, recorrendo às suas reminiscências joãogilbertianas, mostrou-se muito à vontade.
[Nota: RC já havia gravado Jobim anteriormente, na versão em espanhol de "Insensatez", no álbum Canciones Que Amo, 1997.]
E o segundo aspecto é que Roberto e Erasmo Carlos, embora parte da "intelectualidade" (propositadamente entre aspas) não reconheça, são autores à altura dos maiores de sua geração. O supracitado Milton Nascimento, Caetano Veloso (presente em Duetos com a sua "Alegria Alegria"), Gilberto Gil - Roberto e Erasmo nada devem a nenhum deles. E isso fica evidente em "Sua Estupidez" (com Gal Costa) e "Amiga" (com Maria Bethânia, disponível apenas no DVD).
O diferencial da dupla é a utilização de uma linguagem mais objetiva, fazendo com que a assimilação da mensagem - por pessoas de qualquer classe social, faixa etária e/ou nível cultural - seja instantânea.
E o Rei, particularmente, como cantor, é um caso à parte: seja no olhar triste ou no sorriso largo... ele é emoção em estado puro.
"Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim", com participação de Ivete Sangalo, é o melhor momento de Duetos
Além de "Amiga", existe uma outra faixa contida somente no DVD: o pot-pourri de faixas da década de 1970 ("Olha", "Você em Minha Vida", "Outra Vez", "Falando Sério", "Um Jeito Estúpido de te Amar" e "Proposta"), cantado na companhia de Rosana "Como uma Deusa" Fiengo. E, na verdade - considerando a habilidade histriônica de Roberto e seus convivas - o audiovisual funciona bem melhor que o seu correlato sonoro.
O melhor momento de Duetos, no entanto, é a arrasadora versão de "Se Eu Não te Amasse Tanto Assim", na qual uma impecável Ivete Sangalo conseguiu levar o cantor às lágrimas. E com isso, Herbert Vianna (co-autor da canção, ao lado de Paulo Sérgio Valle) comete a façanha de ser o único compositor de sua geração a ser gravado por Roberto Carlos.
Destaque também para a boa versão rock de "Além do Horizonte", com Jota Quest (o anfitrião parecia confortável no arranjo da banda mineira); a linda "Mucuripe", duo com Fagner (parceria deste com Belchior, que RC registrou pela primeira vez em 1975); e a surpreendente "Rei do Gado", cantada com Sérgio Reis e Almir Sater - que pode ser compreendida como uma forma de Roberto, talvez, mencionar o epônimo álbum de 2005, de acentuado sabor regional.
Aliás, ainda com respeito ao CD do ano retrasado: esse é a segunda vez consecutiva em que Chitãozinho & Xororó (aqui presentes em "Amazônia") participam do disco de Roberto. Em 2005, eles participaram de "Arrasta uma Cadeira".
[Nota: há uma outra coincidência em relação à bolacha de 2005. Novamente o espectro do outro Rei - o do Rock -, Elvis Presley, paira sobre o álbum de RC: no trabalho anterior em "Loving You"; e agora, ao lado do Tremendão Erasmo Carlos, no medley "Tutti-Frutti/ Long Tall Sally/ Hound Dog/ Blue Suede Shoes/ Love Me Tender", de 1977.]
Bem, é óbvio que todos esperam novidades de seus artistas favoritos. Mas o fato é que Roberto Carlos já é parte da História - e, conseqüentemente, Duetos é um trabalho histórico. Além disso, considerando os encontros que o Rei guarda em seus arquivos - com Chico Buarque ("O Que Será (A Flor da Pele)"); Titãs ("Pra Dizer Adeus"); a já mencionada Maria Bethânia ("Fera Ferida"); Djavan ("Correnteza"); Tim Maia ("Pede a Ela"); Blitz ("A Dois Passos do Paraíso") e Leandro & Leonardo ("À Distância"), entre tantos outros -, até que Duetos 2... não seria uma má idéia...
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 129 (fevereiro de 2007). Disponível também no site oficial da JOVEM GUARDA.
O Rei compila duetos de seus especiais globais - escolhidos, segundo o próprio, por critérios "emocionais" - e lança em CD e DVD
Na sua tradicional entrevista coletiva anual, Roberto Carlos manifestou o desejo de ter lançado um álbum de inéditas no último Natal - e só não o fez, por ter, nas palavras do próprio, "demorado a começar a compor". Dessa feita, surgiu o projeto Duetos, que reúne em CD e DVD - como o título anuncia - duos de Roberto com ilustres convidados em seus especiais de fim-de-ano, escolhidos pelo Rei por critérios "emocionais".
Já se pode ouvir o murmúrio daqueles que Nelson Rodrigues classificaria como "os idiotas da objetividade", descontentes pelo fato de o cantor, mais uma vez, não ter lançado um trabalho com novas canções [o último foi Pra Sempre, 2003; e antes desse, Amor Sem Limite, 2000].
E o que há para se dizer sobre isso é simples: feliz do artista que atinge um determinado estágio na carreira, que permite que ele possa... se divertir (no melhor sentido) com seu farto acervo. O mesmo vale para os Rolling Stones, que, em 2003, lançaram a magnífica caixa quádrupla Four Flicks, reunindo três formatos diferentes de shows (estádio, arena e teatro), nos quais inúmeras pérolas obscuras foram resgatadas - algumas, até então, jamais haviam sido executadas ao vivo.
Outra observação que certamente será feita é a respeito da "diferença do padrão sonoro entre as faixas". Bem, considerando o hiato de 28 anos entre o fonograma mais antigo, de 1977, e o mais recente, de 2005 (e o conseqüente avanço das técnicas de gravação nesse período), esse contraste é natural, não?
Em Duetos, imediatamente, dois aspectos pouco comentados saltam aos olhos (e ouvidos). O primeiro é que Roberto é um soberbo intérprete para os clássicos de MPB - se ele, um dia, decidir lançar um álbum nesses moldes, certamente será um trabalho formidável. Os maiores exemplos disso são a tocante "Coração de Estudante", com direito a vocalises de Milton Nascimento e piano de Wagner Tiso, e "Lígia", com acompanhamento do maestro Antônio Carlos Jobim, onde o cantor, recorrendo às suas reminiscências joãogilbertianas, mostrou-se muito à vontade.
[Nota: RC já havia gravado Jobim anteriormente, na versão em espanhol de "Insensatez", no álbum Canciones Que Amo, 1997.]
E o segundo aspecto é que Roberto e Erasmo Carlos, embora parte da "intelectualidade" (propositadamente entre aspas) não reconheça, são autores à altura dos maiores de sua geração. O supracitado Milton Nascimento, Caetano Veloso (presente em Duetos com a sua "Alegria Alegria"), Gilberto Gil - Roberto e Erasmo nada devem a nenhum deles. E isso fica evidente em "Sua Estupidez" (com Gal Costa) e "Amiga" (com Maria Bethânia, disponível apenas no DVD).
O diferencial da dupla é a utilização de uma linguagem mais objetiva, fazendo com que a assimilação da mensagem - por pessoas de qualquer classe social, faixa etária e/ou nível cultural - seja instantânea.
E o Rei, particularmente, como cantor, é um caso à parte: seja no olhar triste ou no sorriso largo... ele é emoção em estado puro.
"Se Eu Não Te Amasse Tanto Assim", com participação de Ivete Sangalo, é o melhor momento de Duetos
Além de "Amiga", existe uma outra faixa contida somente no DVD: o pot-pourri de faixas da década de 1970 ("Olha", "Você em Minha Vida", "Outra Vez", "Falando Sério", "Um Jeito Estúpido de te Amar" e "Proposta"), cantado na companhia de Rosana "Como uma Deusa" Fiengo. E, na verdade - considerando a habilidade histriônica de Roberto e seus convivas - o audiovisual funciona bem melhor que o seu correlato sonoro.
O melhor momento de Duetos, no entanto, é a arrasadora versão de "Se Eu Não te Amasse Tanto Assim", na qual uma impecável Ivete Sangalo conseguiu levar o cantor às lágrimas. E com isso, Herbert Vianna (co-autor da canção, ao lado de Paulo Sérgio Valle) comete a façanha de ser o único compositor de sua geração a ser gravado por Roberto Carlos.
Destaque também para a boa versão rock de "Além do Horizonte", com Jota Quest (o anfitrião parecia confortável no arranjo da banda mineira); a linda "Mucuripe", duo com Fagner (parceria deste com Belchior, que RC registrou pela primeira vez em 1975); e a surpreendente "Rei do Gado", cantada com Sérgio Reis e Almir Sater - que pode ser compreendida como uma forma de Roberto, talvez, mencionar o epônimo álbum de 2005, de acentuado sabor regional.
Aliás, ainda com respeito ao CD do ano retrasado: esse é a segunda vez consecutiva em que Chitãozinho & Xororó (aqui presentes em "Amazônia") participam do disco de Roberto. Em 2005, eles participaram de "Arrasta uma Cadeira".
[Nota: há uma outra coincidência em relação à bolacha de 2005. Novamente o espectro do outro Rei - o do Rock -, Elvis Presley, paira sobre o álbum de RC: no trabalho anterior em "Loving You"; e agora, ao lado do Tremendão Erasmo Carlos, no medley "Tutti-Frutti/ Long Tall Sally/ Hound Dog/ Blue Suede Shoes/ Love Me Tender", de 1977.]
Bem, é óbvio que todos esperam novidades de seus artistas favoritos. Mas o fato é que Roberto Carlos já é parte da História - e, conseqüentemente, Duetos é um trabalho histórico. Além disso, considerando os encontros que o Rei guarda em seus arquivos - com Chico Buarque ("O Que Será (A Flor da Pele)"); Titãs ("Pra Dizer Adeus"); a já mencionada Maria Bethânia ("Fera Ferida"); Djavan ("Correnteza"); Tim Maia ("Pede a Ela"); Blitz ("A Dois Passos do Paraíso") e Leandro & Leonardo ("À Distância"), entre tantos outros -, até que Duetos 2... não seria uma má idéia...
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