sexta-feira, 25 de janeiro de 2008

Djavan: 'politicamente incorreto' ou 'ritual do habitual'

CD Matizes (Luanda Music)
2007


Resenha publicada originalmente no jornal
IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 137 (outubro de 2007).



Em Matizes, Djavan apresenta sua sonoridade característica e ainda arrisca uma letra de cunho... hum, político

Djavan acaba de lançar disco novo: Matizes, que - a exemplo dos anteriores Na Pista, Etc (2005) e Vaidade (2004) - está sendo editado pelo selo próprio Luanda Music. Com sua bonita capa multicolorida, é o décimo oitavo trabalho do artista alagoano.

Depois de brincar com beeps e tóins em seu último CD, o supracitado projeto especial Na Pista, Etc. - no qual alguns de seus sucessos foram regravados com um pulso dançante - o músico, dessa vez, optou por compor solitariamente uma dúzia de canções (não muito inspiradas) que soam exatamente como... Djavan. O que acaba deixando o álbum com um inegável sabor de déjà vu.

O disco até que começa bem, com “Joaninha” - boa melodia e arranjo interessante. Mas, daí em diante, começa o ritual do habitual: aquele violão sincopado aqui, um funk ali (“Adorava me Ver como Seu”), alguns sambas acolá (como a sofisticada - e ufanista - “Delírio dos Mortais”, em homenagem à nossa cidade... , “maravilhosa”), e por aí vai. “Pedra”, o primeiro single de trabalho, é um pop refinado com um discreto tempero jazzy, semelhante a inúmeras faixas anteriores de Djavan. Traz, inclusive, os mesmos clichês (“Não mais a vi, desde abril./ Fui pro mar/ e você lá, deitada na pedra/ que inveja dessa pedra”. Puxa, que poético, não?).

Aliás, o quesito letra continua a apresentar típicas esquisitices do estilo “nem-que-eu-bebesse-o-mar-encheria-o-que-eu-tenho-de-fundo”. O mais embaraçoso exemplo disso está em “Imposto”. Não que o compositor esteja equivocado em suas considerações acerca da (imoral) carga tributária brasileira. Pelo contrário: as afirmativas da canção são absolutamente procedentes. O problema é a ingenuidade da narrativa - um adolescente ginasiano faria uma redação mais pertinente. Djavan poderia expor o seu descontentamento político de maneira mais adulta.

Um trechinho da letra: “IPVA, IPTU, CPMF forever/ É tanto imposto que eu já nem sei./ ISS, ICMS, PIS e COFINS, pra nada./ Integração Social, aonde?/ Só se for no carnaval/ Eles nem tchum./ Mas tu paga tudo”. Outro: “Ainda tem a farra do I.R./ Dinheiro demais!/ Imposto a mais, desvio a mais/ E o benefício é um horror!/ Estradas, hospitais, escolas/ Tsunami a céu aberto/ Não está certo./ Pra quem vai tanto dinheiro?” Reparem no trocadilho brilhante: “Pois o homem que recolhe o imposto... é o impostor”.

Coisa triste, meu Deus. Já ouviram falar em “vergonha alheia”?

Resumo da ópera: a verdade é que, descontando os deslizes líricos, Djavan, com suas harmonias complexas (ouça “Louça Fina” e a faixa-título), continua tendo uma grande musicalidade. Criou, aliás, uma fórmula que influenciou a muitos - mas, ironicamente, encontra-se aprisionado nela. Contudo, se você é fã, vá fundo. Os matizes dessa caixa de lápis de cor você certamente conhece bem...

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