sábado, 6 de janeiro de 2007

Lulu Santos: manhas & mumunhas

CD
Letra & Música (Sony BMG)
2005


Resenha publicada no jornal
IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 117 (novembro de 2005).





Dois anos após o seu último CD de estúdio (Bugalu, de 2003, produzido pelo DJ Memê) - sem contar o ótimo MTV Ao Vivo, do ano passado -, o cantor e compositor Lulu Santos ressurge com Letra & Música (Sony BMG). Nos pouquíssimos momentos do álbum em que as programações eletrônicas aparecem, as mesmas são discretas, ao contrário das ostensivamente inseridas por Memê no CD anterior. Em suma: Lulu realizou, decididamente, um disco com acento roqueiro. Exceção feita a "zerodoisum", realista homenagem ao Rio de Janeiro: melodia típica de Marcos Valle, "escondida" sob seqüenciadores e vocais distorcidos.

Os trabalhos são iniciados com "Gambiarra", reflexão sobre "as luzes da ribalta" - ou, se preferir, um retrato-do-artista-enquanto-personagem: "eu sou o que eu todo mundo conhece, mas não sabe bem quem é (...)/ quando ligam a gambiarra, eu começo a existir".

Letra & Música prossegue com bons temas autorais como "Roleta", "Manhas & Mumunhas" e "Sinhá & Eu". A tocante "Vale de Lágrimas", em mãos erradas, poderia resultar em um autêntico muro das lamentações. Mas não em se tratando do músico carioca, que cometeu um número verdadeiramente intenso, um dos destaques do CD. As guitarras marcam presença durante todo o trabalho - o que é bem oportuno, visto que Lulu é um especialista em texturas desse instrumento. Curiosamente, "Bonobo Blues" traz até um solo, coisa que o artista vinha evitando em seus recentes registros em estúdio. Pela primeira vez, o cantor aproveita para registrar a sua "Din Don" - composta há 28 anos! -, que remete a "Bim Bom", faixa do histórico Chega de Saudade, de João Gilberto.

O álbum também conta com duas regravações: "Ele Falava Nisso Todo Dia", de Gilberto Gil, que seria registrada há 13 anos atrás no Songbook Gilberto Gil, projeto do falecido Almir Chediak, em homenagem ao atual Ministro de Cultura, caso a fita não tivesse sido misteriosamente... apagada. A versão de Lulu capricha nas distorções. E, além dessa, a surpresa do CD: "Pop Star", de João Penca & Seus Miquinhos Amestrados, que foi escolhida como o primeiro single de trabalho e também batiza a turnê nacional do guitarrista. Lulu usa de fina ironia para, na letra, "trocar de canal": "a sua mãe não percebe o feeling da minha guitarra no dez/ e ela vendo a novela no onze". E com isso (a exemplo de "Made In Brazil", do Acústico MTV, lançado em 2000), ele parece se posicionar ao lado de seus congêneres/contemporâneos da música brasileira, surgidos na década de 80 - percebidos erroneamente como roqueiros, somente.

O blues instrumental "Circulando" (com interessantes ruídos de "vinil antigo" ao fundo) fecha o ótimo disco desse nome fundamental da nossa música. Parafraseando o próprio, pode-se dizer com convicção que Lulu Santos sabe todas as "manhas & mumunhas" de como se conceber um grande trabalho.

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