CD e DVD Os Britos Cantam The Beatles (Som Livre)
2006
Resenha publicada no jornal IM - INTERNATIONAL MAGAZINE, edição nº 126 (outubro de 2006).
O falso óbvio: quatro músicos experientes reúnem-se para um projeto paralelo em torno de um repertório consagrado. Beleza. E o resultado desse esforço coletivo é... brilhante, certo?
Errado.
O quarteto em questão atende pelo nome de Os Britos e é formado por George Israel (saxofonista do Kid Abelha, mas que, nesse trabalho, é responsável pela guitarra e pelos vocais), Nani Dias (produtor e guitarrista que já acompanhou Lobão, entre outros), Rodrigo Santos e Guto Goffi (respectivamente, baixista e baterista do Barão Vermelho). O grupo acaba de lançar CD + DVD Os Britos Cantam The Beatles, e aí cabe a pergunta: para quê?
Todo fundamentalismo é algo complicado, mas a verdade que, para os apreciadores da boa música pop, o cancioneiro do Beatles é, mal comparando, um território sagrado como Meca o é para os xiitas seguidores de Maomé. A nossa querida vovozinha Rita Lee cometeu em 2001 um disco bacana com versões simpáticas e nada previsíveis de pérolas como "If I Fell", "In My Life" e outras. Mas é aquela história: para vestir essa camisa... é preciso uma idéia muito boa.
E não foi exatamente o que ocorreu aqui. O álbum traz versões, acústicas em sua maioria, de canções majoritariamente da primeira fase dos rapazes de Liverpool (como "Nowhere Man", "I Feel Fine", "Ticket To Ride", "Drive My Car" e "I Need You", entre outras), tocadas por uma banda cover de luxo dos Fab Four. Mas que soa exatamente como o grupo daquele seu tio que acha que os anos 60 ainda não acabaram.
Nem a afinação de Paula Toller consegue acrescentar algum tempero à versão insípida de "Something". E melhor nem usarmos como parâmetro a gravação original contida em Abbey Road (1969): basta compararmos com o registro emocionante de Eric Clapton em dueto com Paul McCartney no já histórico Concert For George. Mas tudo bem - Os Britos e Paula não estão sozinhos nessa mancada: até um totem da MPB como o Ministro Gilberto Gil, certa vez, tropeçou em sua versão rasta do clássico de George Harrison.
Mas antes que alguém pergunte onde está o senso de humor do escriba, é importante dizer que Os Britos, ao que parece, decidiram fazer a coisa a sério: prova disso é que, ao lado desses clássicos, os caras ainda incluíram... duas músicas próprias inéditas (!). Que era tudo o que eles jamais deveriam fazer - soa pretensioso pacas (ainda que "Dia Comum" não seja má).
Para não dizer que é tudo em vão, Zélia Duncan está ótima na versão de "Two Of Us". Assim como o resgate da pouco conhecida "Rain" (lado B de "Paperback Writer") foi uma boa idéia - e a faixa traz algo do clima hindu Love You Too, contando com a participação do mutante Sérgio Dias. E a versão "While My Guitar Gently Weeps" traz boas guitarras de Nani Dias e Roberto Frejat, que ainda gravou o vocal principal.
Músicos amadores e profissionais sempre irão recorrer à música dos Beatles, como quem bate uma pelada em um dia de domingo. E isso, por si só, já justifica a existência d'Os Britos: quatro bons instrumentistas debruçando-se sobre a melhor obra pop do mundo podem realizar um show até divertido, coisa e tal. Mas registrar isso, estando a toda a discografia dos Beatles em catálogo? Enfim, um autêntico fim de semana perdido.
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